Contrato de relacionamento afetivo

Quando duas pessoas iniciam um relacionamento, 
está implícito um contrato, com cláusulas invisíveis, 
com acordos subentendidos e assinado por ambos, 
sem terem lido as letrinhas miúdas...

O exercício abaixo serve como recurso para o psicoterapeuta levantar hipóteses sobre o tipo de contrato firmado pelo casal, que está em atendimento.

Pode ser feito separadamente ou com os dois em sessão, respondendo por escrito.

Também pode ser feito por você, leitor deste texto.

PENSE NUM RELACIONAMENTO AFETIVO QUE VOCÊ VIVEU OU ESTÁ VIVENDO E RESPONDA:

  1. Qual o local que vocês estavam, quando começou o namoro, ou quando sentiram que estavam namorando, ou que aconteceu o “pedido em namoro”?
  2. Qual era o clima desse momento?
  3. Quem estava por perto ou que apadrinhou o relacionanento?
  4. O que mais o (a) atraiu (naquele momento), nessa pessoa?
  5. O que você pensa que deixou o outro atraído por você naquele início?
  6. Qual foi a sua expectativa naquele momento inicial?
  7. O que você estava vivendo (de significativo) naquela época?
  8. Que sinal, fala, atitude significativa você percebeu naquele momento?
  9. Qual é a atitude ou jeito que mais afasta você, atualmente, dessa pessoa?

* em geral o que atraiu inicialmente, passa a ser o ponto de discórdia.

INÍCIO – A PAIXÃO

Como começa tradicionalmente uma relação afetuosa?

Começa pela paixão, embora existam casais que se apaixonaram depois de serem amigos ou conhecidos. Mas a primeira fase natural é a paixão, na qual ocorre bloqueio do hemisfério cerebral esquerdo.

Toda vez que nos apaixonamos, há uma reação inclusive química. Vamos segregar e liberar mais substâncias, como endorfina e pequenas doses de dopamina, usando mais de nosso hemisfério cerebral direito.

Nota: a endorfina dá a sensação de plenitude, de ser querido, de estar de bem com a vida e a dopamina dá excitação.

Na paixão existe o bloqueio do hemisfério cerebral esquerdo e, assim, a lucidez e clareza chegam a graduações mínimas. O hemisfério cerebral direito é soberano nessa fase. O sujeito da nossa paixão só tem qualidades e é a única pessoa capaz de nos fazer felizes, tornando-se a “coisa” mais importante. Já o trabalho, a família, os amigos, os hobbies, tudo em volta é mero complemento dispensável.

A fase da paixão é dolorosa, porque é caracterizada pelo exagero. Queremos muito que tudo dê certo. Isso vai prevalecer até o momento em que o hemisfério cerebral esquerdo for novamente acionado e nos mostrar a realidade externa.

Então o apaixonado “cai na real” e começa a fazer uma retomada da vida (trabalho, amigos, família, etc). Acontece, geralmente, primeiro com o homem, que passa a identificar que gosta muito da companheira.

Sabe-se que uma paixão pode durar minutos e, no máximo, dois anos. Caso se estenda, adquire um caráter patológico, de obsessão. A paixão pode desdobrar-se em amor ou acabar de vez.

FASE DO AMOR

"Temos pressa para ouvir "eu te amo".

Não vemos a hora de que fiquem estabelecidos as regras do convívio:
somos namorados, ficantes, casados, amantes?...
Esquecemos entanto da palavra que viabiliza esse sentimento: paciência.
Amor sem paciência não vinga!"

Passada a primeira fase da paixão, as projeções foram checadas no real e, então, resta saber se essa paixão vai desdobrar-se em amor. Aqui é o momento que nos permitirá ter um tempero. O muito passa a ficar mais calibrado com a realidade.

Os dois enamorados retomam atividades individuais e passam a ver a outra pessoa em profundidade, com qualidades e defeitos e resolvem levar o “pacote” inteiro – qualidades e defeitos, sonhos e realidade.

Nessa fase do amor é que devemos fazer uma recontratação amorosa. Por que nessa transição? Porque tudo em transição está em movimento, e é em time que está ganhando que se mexe. E assim, faremos sucessivas mudanças para que essa relação não degenere.

CRISES CONJUGAIS
"Amor permanente...como a gente se agarra nesta ilusão. 
Pois se nem o amor pela gente mesmo resiste tanto tempo sem umas reavaliações. 
Por isso nos transformamos, temos sede de aprender, de nos melhorar, 
de deixar pra trás nossos imensuráveis erros, nossos achaques, nossos preconceitos, 
tudo o que fizemos achando que era certo e hoje condenamos. 
O amor se infiltra dentro de nós, mas seguem todos em movimento: 
você, o amor da sua vida e o que vocês sentem. 
Tudo pulsando independentemente, 
e passíveis de se desgarrar um do outro."
Martha Medeiros

Tudo o que está vivo é cíclico, sobe, desce, alterna. A crise num relacionamento é o aviso que a vida nos dá de que uma mudança deveria ser feita e não foi. A crise, geralmente, se estabelece na entrada de um terceiro elemento (gravidez, filho, sogra, trabalho, amante, etc.).

A crise conjugal é caracterizada por um sentimento de traição (alguém traiu alguém); ou foi enganado, pensou que era de um jeito e se mostrou de outro.

A época da crise é a época melhor para fazer uma psicoterapia, para se efetuar mudanças. Mas, caso isso não se apresente, de fato, quando o casal procura terapia, através de um filho, por exemplo, o terapeuta vai criar uma “crise”, para tirar as pessoas da paralisia.

Destino da crise: ou a relação vai ser renovada ou vai terminar.

A recontratação vai ser possível quando:

  1. Não se deixou passar tempo demais, porque dependendo da situação, a dificuldade inicial já virou problema, sintoma, doença ou até já “morreu”.
  2. O grau de investimento afetivo de cada um for igual.
  3. O grau de esclarecimento, no qual cada um deve voltar para si responsabilidades que lhe pertence.
  4. Nenhum dos dois trabalha mais pela relação (50% de cada um).
  5. O casal aprender a lidar com realidade atualizada: nada vai ser como antes. Pode ser melhor, mas como era no início, não tem mais jeito.

RELAÇÕES SENIS E RECONTRATAÇÕES

Todo relacionamento de tempos em tempos, precisa de uma faxina. Arrumar novos lugares, mudar algumas cláusulas e até reciclar (como no caso de amizades). Porque à medida que evoluímos e mudamos de nível, alguns relacionamentos ou pessoas não cabem mais em nossas vidas.

Também os relacionamentos afetivos ficam senis, caducos quando não se renovam. Quanto mais se usa algo, mais precisamos cuidar.

No caso de um relacionamento de casamento, por exemplo, tem que revitalizar, renovar, não deixar envelhecer. Fazer “revisões e manutenções de peças” de acordo com o tempo de uso.

Casamento tem tudo para dar errado, porque são duas pessoas diferentes, de famílias diferentes, de valores diferentes e que se não prestarem atenção e se cuidarem (caso valha a pena), a união pode ficar estragada e até acabar!

Os relacionamentos afetivos devem ser revitalizados, renovados. De que forma? Das mais variadas possíveis, dependendo do seu interesse e do interesse do outro pelo relacionamento. Desde se fazer boa companhia (interessante e interessado), até uma psicoterapia.

TÉRMINO DO RELACIONAMENTO

Para apreciar melhor este poema de Clarice Lispector, você deve lê-lo
de cima para baixo
e depois de baixo para cima.

Não te amo mais.
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis.
Tenho certeza que
Nada foi em vão.
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer jamais que
Alimento um grande amor
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
Eu te amo!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais.

O término acontecerá quando o investimento, o tempo e a responsabilidade pelo relacionamento ficar contaminados.

Tem relacionamentos que realmente cumpriram a sua função na nossa vida e acaba. E insistir nisso é pura caduquice! Vieram como um mensageiro, nos contando coisas, nos fazendo aprender e evoluir.

No caso do término do relacionamento afetivo, nós psicoterapeutas vamos ter que ser muito criteriosos para ajudá-los na partilha (dividir livros, fotos, móveis, bens, etc) e vamos ajuda-los também a cotizar responsabilidades com os filhos.

Mas a função mais importante do terapeuta será ajudar na partilha de sentimentos: devem sair duas pessoas inteiras, separadas, mas cada uma com hemisfério cerebral esquerdo, o racional e hemisfério cerebral direito (o emocional) em funcionamento.

O que normalmente acontece é que no término do relacionamento, um dos parceiros fica muito emocional e o outro muito racional. O que apresenta mais racionalidade sai arrebentando com tudo, namora muito, tira o atraso, etc. E o outro que saiu com o hemisfério direito mais acionado, cai na melancolia e nostalgia.

Separação parece cirurgia.
Depois que já tentou de tudo é que se faz o corte cirúrgico.
Toda separação é muito traumática.
Elaboração: Jaqueline Cássia de Oliveira
Psicóloga e psicoterapeuta familiar sistêmica
CRP - 04/7521
Fonte:
Material didático - Casais & Famílias

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